Voltamos a Sabará, onde estávamos hospedadas. Muito decepcionadas, sob vários aspectos e conscientes de que os senhores de engenho continuam aí tentando nos acorrentar, tentando impedir nossa visão, apagar nossos traços e memórias, tentando nos afastar. A mim pareceu uma pancada na cabeça. Já não era mais “inocente, puro e besta”, como diria Raul. Um despertar dolorido.
Desnudadas as intenções de ontem e (ainda) hoje, era hora de buscar outra fonte. Seguimos para Belo Horizonte. O centro da capital tem ruas largas e arborizadas. Tudo parece muito planejado. A verdade é que nada mais encantava na viagem. O receio de buscarmos, novamente, algo que desfizesse a má impressão (e o resultado fosse ainda mais desastroso), era latente.
Pensamos em visitar a Pampulha, mas resolvemos não ir mais a lugar algum e ficar por ali, numa daquelas ruas. Ainda reflexivas, tentamos salvar o que restou do passeio ouvindo um grupo de chorinho, de tons de pele e idade variada, a mistura que esperava ver, desde o começo, talvez. Assim, depois de tudo, curiosamente acabamos a tarde ouvindo Chiquinha Gonzaga, Gil, e Noite Ilustrada.
segunda-feira, 27 de julho de 2009
“Inocente, puro e besta” - Em Ouro Preto
Ler nas entrelinhas pode ser doloroso. E assim o foi em Ouro Preto. Chegamos cheias de expectativa sobre o que história da cidade poderia nos proporcionar. Logo quando descemos ao centro, perceber a incrível semelhança com o centro histórico de Salvador foi um exercício divertido. Era como se reconhecêssemos cada pedacinho dos sobrados, as ruas, ladeiras e cores. Tínhamos um roteiro já organizado, mas foi impossível deixar de visitar alguns locais não previstos. E, sinceramente, ainda bem o fizemos.
Um desses pontos não escolhidos foi a Casa dos Contos. Um museu instalado num antigo casarão, com senzala e tudo mais. Eram muitas as exposições espalhadas pela Casa: telas de artistas europeus, a história da moeda brasileira desde o período colonial, uma cozinha de escravos e a senzala. Depois da sugestão de roteiro feita pelo guia na entrada, ficamos curiosas com o que encontraríamos na senzala. Esperávamos emoções fortes. Não quis repetir o que aconteceu no Museu Afro em São Paulo ao visitar primeiramente a réplica de um navio negreiro. O impacto foi tão forte que não tive ânimo, vontade, nem estômago para ver mais nada.
Enfim rodamos todos os andares da casa. Ouvimos as explicações muito bem explanadas dos guias que, atentos a todas e quaisquer dúvidas dos visitantes, reforçavam o que estava colocado em desenhos e descrições colados às paredes! Era hora de descermos até a senzala. Fomos primeiro ao local onde eles disseram funcionar a cozinha dos escravos. A não ser pela placa na qual estava escrito “cozinha dos escravos”, nada mais indicava o que funcionava ali. Um verdadeiro buraco onde cabiam umas cinqüenta pessoas de pé. Havia outras aberturas nas quais – deduzimos – era por onde eles recebiam e mantinham quente a comida.
Na “cozinha dos escravos” não tinha desenhos, descrições ou guias. Havia uma grande balança, sem precedentes ou explicações bibliográficas. Perguntamos a uma das guias fora do local e ela confirmou a suspeita: Aquela balança não integrava o ambiente, mas fora colocada ali por não haver outro lugar. Ela também não tinha muitas informações sobre a “cozinha” a não ser que, além de tudo, a água do casarão escoava por ali.
Pasmas, descemos finalmente à senzala, na tentativa de salvar o passeio. Não havia guia, mas um segurança, e a única informação passada por ele foi a proibição de fotografar. De um lado, os primeiros objetos da exposição colocados numa mesa de pouco mais de um metro: ferramentas usadas para prender, torturar, castigar e marcar os escravos. Essa mesa trazia pequenas telas mostrando como alguns desses objetos eram usados. Esses instrumentos e a umidade do local foram tudo o que havia de mais próximo do que acreditávamos ser uma senzala!
O que vimos no restante do acervo dizia claramente que fizeram dali um luxuoso paiol de quinquilharias históricas: Uma cadeira odontológica, chinelinhos de ouro e prata, imensas panelas de barro, talheres, revólveres, facas e outros objetos cortantes, ferramentas de fábrica utilizadas para colheita entre outros itens. Depois de horas de leituras em arquivos e leituras diversas ao longo dos anos, não dava pra engolir que os escravos usufruíam o que ali estava exposto. E, se na cozinha colocaram uma balança fora do contexto, o que impediria de cometer outro absurdo?!
Preenchemos o “formulário para críticas, sugestões e reclamações”. Usamos quase todo o espaço. Lembro que no meio da queixa mencionei que atitudes como aquelas perpetuam as truculências e nos remota os cenários de duzentos, trezentos anos atrás. Senti que a tão esperada visita a Ouro Preto acabava ali.
As entrelinhas não são imparciais
Na tentativa de digerir “o que não vimos”, seguimos andando até a praça central, onde está o monumento a Tiradentes. Muitos estudantes espalhados fazendo fotos pendurados na estátua. Tomamos outro caminho. A idéia era irmos até a Mina do Chico Rei, figura que, segundo relatos, era um escravo que enquanto escavava a mina, ia guardando ouro e o que mais encontrasse de valor em buracos espalhados nas paredes das escavações. Assim, ajudou a construir, por exemplo, a Igreja de Santa Efigênia. No caminho, um homem, visivelmente bêbado passou a nos seguir. Dizia saber onde era a mina e poderia nos levar. Achamos tê-lo despistado e entramos no lugar.
A entrada para mina era dividida com um restaurante que não pareceu nada popular. Ainda para nossa surpresa, o homem que tomava conta da mina – e recebia o dinheiro das entradas – era branco, com seus quarenta anos talvez. Disse que a propriedade pertencia a sua mãe. Mas, grande mesmo foi o espanto em saber que aquele homem bêbado que nos seguia, realmente trabalhava para ele e seria nosso guia lá dentro.
Enquanto colocávamos os capacetes, obrigatórios para adentrar a mina, o dono do espaço foi avisando que iríamos gostar de conhecer um ponto tão importante e que dizia respeito a “nossa história”, a “história do nosso povo”. Mas o que isso significava? Era ele uma espécie de ariano? Uma raça pura e superior? A ele só faltava o chicote! À medida que adentrávamos a mina, íamos pensando na falta de cuidado daquele homem com o funcionário. O que nos garantia que era feita manutenção na mina? Que condições teria aquele homem de orientar alguém em caso de acidente lá dentro? Um simples mal estar? Pelo sim, pelo não, abandonamos a aventura.
Era impossível estar indiferente, ser neutro. Entretanto, boas pesquisadoras buscariam outras fontes, mesmo que reforçassem a impressão que tínhamos até ali. Seguimos. De igreja em igreja, pagando taxas de entrada, ouvindo guias de idades variadas, mas quase todos negros. Desistimos de entrar no Museu da Independência para buscarmos as obras de Aleijadinho. Um segurança, negro, alto se prontificou e nos orientou a chegar no que ele chamou de “nossas igrejas” ou “igrejas mais importantes para nós”. Falou baixinho, um pouco acanhado pela ênfase, quis crer. Fez questão de sair da guarita e nos mostrar onde era.
Curiosamente, todas as igrejas, feitas e freqüentadas pelos negros do período colonial, segundo referências bibliográficas, foram erguidas muito longe do centro. Uma dessas era a Santa Efigênia, aquela construída pelo Chico Rei e na qual encontraríamos traços da obra de Aleijadinho. Uma subida sem fim. A impressão que tínhamos é que a igreja acompanhava o trajeto: Quanto mais andávamos, ela também o fazia! Mais de trezentos metros subindo pela estrada de pedra, descobrimos que está fechada há mais de ano, esperando uma reforma já autorizada. Estava difícil não compreender o que entrelinhas da cidade queriam nos dizer.
Havia muitas casas no alto das montanhas em Ouro Preto, tal qual em Sabará. A diferença em Ouro Preto é que a disposição das igrejas, o tom de cada palavra dita, o descuido com o povo que ergueu e construiu a base da cidade, tudo insinuava uma segregação. Era como se, historicamente, afastando o povo negro tentassem abafar, apagar as marcas das atrocidades. Mas, para um bom entendedor, Ouro Preto agride quando usa as mesmas estratégias para gritar o que houve – e ainda há – no que diz respeito a dominação. Como se em ladeiras e vielas da cidade ainda pudéssemos escutar o estalar dos chicotes.
Vista da cidade do alto da ladeira, de frente a Igreja de Santa Efigênia
Um desses pontos não escolhidos foi a Casa dos Contos. Um museu instalado num antigo casarão, com senzala e tudo mais. Eram muitas as exposições espalhadas pela Casa: telas de artistas europeus, a história da moeda brasileira desde o período colonial, uma cozinha de escravos e a senzala. Depois da sugestão de roteiro feita pelo guia na entrada, ficamos curiosas com o que encontraríamos na senzala. Esperávamos emoções fortes. Não quis repetir o que aconteceu no Museu Afro em São Paulo ao visitar primeiramente a réplica de um navio negreiro. O impacto foi tão forte que não tive ânimo, vontade, nem estômago para ver mais nada.
Enfim rodamos todos os andares da casa. Ouvimos as explicações muito bem explanadas dos guias que, atentos a todas e quaisquer dúvidas dos visitantes, reforçavam o que estava colocado em desenhos e descrições colados às paredes! Era hora de descermos até a senzala. Fomos primeiro ao local onde eles disseram funcionar a cozinha dos escravos. A não ser pela placa na qual estava escrito “cozinha dos escravos”, nada mais indicava o que funcionava ali. Um verdadeiro buraco onde cabiam umas cinqüenta pessoas de pé. Havia outras aberturas nas quais – deduzimos – era por onde eles recebiam e mantinham quente a comida.
Na “cozinha dos escravos” não tinha desenhos, descrições ou guias. Havia uma grande balança, sem precedentes ou explicações bibliográficas. Perguntamos a uma das guias fora do local e ela confirmou a suspeita: Aquela balança não integrava o ambiente, mas fora colocada ali por não haver outro lugar. Ela também não tinha muitas informações sobre a “cozinha” a não ser que, além de tudo, a água do casarão escoava por ali.
Pasmas, descemos finalmente à senzala, na tentativa de salvar o passeio. Não havia guia, mas um segurança, e a única informação passada por ele foi a proibição de fotografar. De um lado, os primeiros objetos da exposição colocados numa mesa de pouco mais de um metro: ferramentas usadas para prender, torturar, castigar e marcar os escravos. Essa mesa trazia pequenas telas mostrando como alguns desses objetos eram usados. Esses instrumentos e a umidade do local foram tudo o que havia de mais próximo do que acreditávamos ser uma senzala!
O que vimos no restante do acervo dizia claramente que fizeram dali um luxuoso paiol de quinquilharias históricas: Uma cadeira odontológica, chinelinhos de ouro e prata, imensas panelas de barro, talheres, revólveres, facas e outros objetos cortantes, ferramentas de fábrica utilizadas para colheita entre outros itens. Depois de horas de leituras em arquivos e leituras diversas ao longo dos anos, não dava pra engolir que os escravos usufruíam o que ali estava exposto. E, se na cozinha colocaram uma balança fora do contexto, o que impediria de cometer outro absurdo?!
Preenchemos o “formulário para críticas, sugestões e reclamações”. Usamos quase todo o espaço. Lembro que no meio da queixa mencionei que atitudes como aquelas perpetuam as truculências e nos remota os cenários de duzentos, trezentos anos atrás. Senti que a tão esperada visita a Ouro Preto acabava ali.
As entrelinhas não são imparciais
Na tentativa de digerir “o que não vimos”, seguimos andando até a praça central, onde está o monumento a Tiradentes. Muitos estudantes espalhados fazendo fotos pendurados na estátua. Tomamos outro caminho. A idéia era irmos até a Mina do Chico Rei, figura que, segundo relatos, era um escravo que enquanto escavava a mina, ia guardando ouro e o que mais encontrasse de valor em buracos espalhados nas paredes das escavações. Assim, ajudou a construir, por exemplo, a Igreja de Santa Efigênia. No caminho, um homem, visivelmente bêbado passou a nos seguir. Dizia saber onde era a mina e poderia nos levar. Achamos tê-lo despistado e entramos no lugar.
A entrada para mina era dividida com um restaurante que não pareceu nada popular. Ainda para nossa surpresa, o homem que tomava conta da mina – e recebia o dinheiro das entradas – era branco, com seus quarenta anos talvez. Disse que a propriedade pertencia a sua mãe. Mas, grande mesmo foi o espanto em saber que aquele homem bêbado que nos seguia, realmente trabalhava para ele e seria nosso guia lá dentro.
Enquanto colocávamos os capacetes, obrigatórios para adentrar a mina, o dono do espaço foi avisando que iríamos gostar de conhecer um ponto tão importante e que dizia respeito a “nossa história”, a “história do nosso povo”. Mas o que isso significava? Era ele uma espécie de ariano? Uma raça pura e superior? A ele só faltava o chicote! À medida que adentrávamos a mina, íamos pensando na falta de cuidado daquele homem com o funcionário. O que nos garantia que era feita manutenção na mina? Que condições teria aquele homem de orientar alguém em caso de acidente lá dentro? Um simples mal estar? Pelo sim, pelo não, abandonamos a aventura.
Era impossível estar indiferente, ser neutro. Entretanto, boas pesquisadoras buscariam outras fontes, mesmo que reforçassem a impressão que tínhamos até ali. Seguimos. De igreja em igreja, pagando taxas de entrada, ouvindo guias de idades variadas, mas quase todos negros. Desistimos de entrar no Museu da Independência para buscarmos as obras de Aleijadinho. Um segurança, negro, alto se prontificou e nos orientou a chegar no que ele chamou de “nossas igrejas” ou “igrejas mais importantes para nós”. Falou baixinho, um pouco acanhado pela ênfase, quis crer. Fez questão de sair da guarita e nos mostrar onde era.
Curiosamente, todas as igrejas, feitas e freqüentadas pelos negros do período colonial, segundo referências bibliográficas, foram erguidas muito longe do centro. Uma dessas era a Santa Efigênia, aquela construída pelo Chico Rei e na qual encontraríamos traços da obra de Aleijadinho. Uma subida sem fim. A impressão que tínhamos é que a igreja acompanhava o trajeto: Quanto mais andávamos, ela também o fazia! Mais de trezentos metros subindo pela estrada de pedra, descobrimos que está fechada há mais de ano, esperando uma reforma já autorizada. Estava difícil não compreender o que entrelinhas da cidade queriam nos dizer.
Havia muitas casas no alto das montanhas em Ouro Preto, tal qual em Sabará. A diferença em Ouro Preto é que a disposição das igrejas, o tom de cada palavra dita, o descuido com o povo que ergueu e construiu a base da cidade, tudo insinuava uma segregação. Era como se, historicamente, afastando o povo negro tentassem abafar, apagar as marcas das atrocidades. Mas, para um bom entendedor, Ouro Preto agride quando usa as mesmas estratégias para gritar o que houve – e ainda há – no que diz respeito a dominação. Como se em ladeiras e vielas da cidade ainda pudéssemos escutar o estalar dos chicotes.
Vista da cidade do alto da ladeira, de frente a Igreja de Santa Efigênia
terça-feira, 21 de julho de 2009
“Inocente, puro e besta” - Em Sabará
Uma boa viagem precisa antes de tudo trazer duas sensações: produtividade e expansão de conhecimentos. Se não tem um, nem outro, meu amigo, receio que perdeu dinheiro e oportunidade de abrir a cabeça.
Assim foi uma semana nas montanhas que abrigam o estado de Minas Gerais, em duas de suas cidades históricas – Sabará e Ouro Preto –, além da capital, Belo Horizonte. Datadas do século XVIII, as cidades de Sabará e Ouro Preto parecem ter parado no tempo com sua arquitetura colonial. Realmente cidades belíssimas, com seus sobrados barrocos. Ambas aproveitam muito bem o aspecto turístico, mas, segundo alguns de seus moradores, não é só o que sustenta as cidades. Dividirei em blocos minhas experiências por esses municípios mineiros.
Vila Real de Sabará está a menos de trinta minutos da capital. Quando cheguei à cidade tive a impressão de estar num desses cenários de novela de época. Seus sobrados coloniais, seu teatro municipal, bandinhas nas ruas, o Museu do Ouro, sua gente de fala mansa e ritmada e jeito simples. Me adaptar àqueles costumes parecia fácil. Parecia. Eu, notívaga, me peguei indo para cama antes das 20 horas! Era segunda-feira e nenhum dos pontos turísticos funcionava. Além disso, os termômetros oscilavam entre 16 e 14 graus, isso é muito frio pra quem a temperatura do local de origem não baixa menos que 21.
Ia bisbilhotar a pesquisa de doutorado de uma amiga. Alguma coisa com a temática da sociedade negra do século 18. Nos hospedamos numa pousada cuja dona trazia muitas histórias. Parecia orgulhosa em dizer de sua descendência negra e baiana. Dona Sônia também contava as muitas historias da cidade. O que era, o que tinha e no que se transformara. De como sua riqueza foi sendo diminuída pelos anos, sem os cuidados do poder público. Conheci outras pessoas que guardavam as mesmas queixas.
Imagino o que era Sabará há alguns anos. Se ainda hoje sobrevivem belas suas igrejas, suas casas, apesar das lamentações de seu povo. Os traços de Aleijadinho estão espalhados na Igreja do Carmo, a força do catolicismo na fé que move as pessoas para cima e para baixo naquelas ladeiras. A mão do escravo também é presente.
Estranhamente vimos poucos negros a andar pela cidade. Os que ali estavam, em sua maioria, o faziam por obrigação: limpando as ruas, empacotando nos supermercados, servindo em bares, farmácias e restaurantes. Curiosa também era a maneira como as pessoas me olhavam. Obviamente logo se percebe um forasteiro numa cidade de interior. Mas parecia ser mais que isso. Não era comum estar nos restaurantes do outro lado do balcão, por exemplo. Logo as pessoas se mostravam inquietas.
Chegamos num final de semana em que se comemorava o aniversário da cidade. Sabará estava completando 334 anos! Os moradores estavam numa animação só. Era um grande acontecimento. Foi quando comecei a ver de onde vinha a “gente de cor” da cidade. E eram muitos. Vinham das partes de trás do centro e do alto dos morros, talvez empurrados para longe com o passar dos anos!
Ouvindo histórias do lugar, freqüentando os arquivos e bares antigos entendi que a maioria das casas e mesmo os empreendimentos da cidade são fruto de herança. Isso explicava o que os negros faziam tão longe de onde tudo acontecia. O que eles herdariam? Passada a febre do ouro, das construções imponentes, da escravatura oficial, o que lhes restaria a não ser o descaso, o isolamento?
Foi desse modo que deixei de ver tão somente a beleza do lugar e passei a ler a história pelas entrelinhas da cidade.
Assim foi uma semana nas montanhas que abrigam o estado de Minas Gerais, em duas de suas cidades históricas – Sabará e Ouro Preto –, além da capital, Belo Horizonte. Datadas do século XVIII, as cidades de Sabará e Ouro Preto parecem ter parado no tempo com sua arquitetura colonial. Realmente cidades belíssimas, com seus sobrados barrocos. Ambas aproveitam muito bem o aspecto turístico, mas, segundo alguns de seus moradores, não é só o que sustenta as cidades. Dividirei em blocos minhas experiências por esses municípios mineiros.
Vila Real de Sabará está a menos de trinta minutos da capital. Quando cheguei à cidade tive a impressão de estar num desses cenários de novela de época. Seus sobrados coloniais, seu teatro municipal, bandinhas nas ruas, o Museu do Ouro, sua gente de fala mansa e ritmada e jeito simples. Me adaptar àqueles costumes parecia fácil. Parecia. Eu, notívaga, me peguei indo para cama antes das 20 horas! Era segunda-feira e nenhum dos pontos turísticos funcionava. Além disso, os termômetros oscilavam entre 16 e 14 graus, isso é muito frio pra quem a temperatura do local de origem não baixa menos que 21.
Ia bisbilhotar a pesquisa de doutorado de uma amiga. Alguma coisa com a temática da sociedade negra do século 18. Nos hospedamos numa pousada cuja dona trazia muitas histórias. Parecia orgulhosa em dizer de sua descendência negra e baiana. Dona Sônia também contava as muitas historias da cidade. O que era, o que tinha e no que se transformara. De como sua riqueza foi sendo diminuída pelos anos, sem os cuidados do poder público. Conheci outras pessoas que guardavam as mesmas queixas.
Imagino o que era Sabará há alguns anos. Se ainda hoje sobrevivem belas suas igrejas, suas casas, apesar das lamentações de seu povo. Os traços de Aleijadinho estão espalhados na Igreja do Carmo, a força do catolicismo na fé que move as pessoas para cima e para baixo naquelas ladeiras. A mão do escravo também é presente.
Estranhamente vimos poucos negros a andar pela cidade. Os que ali estavam, em sua maioria, o faziam por obrigação: limpando as ruas, empacotando nos supermercados, servindo em bares, farmácias e restaurantes. Curiosa também era a maneira como as pessoas me olhavam. Obviamente logo se percebe um forasteiro numa cidade de interior. Mas parecia ser mais que isso. Não era comum estar nos restaurantes do outro lado do balcão, por exemplo. Logo as pessoas se mostravam inquietas.
Chegamos num final de semana em que se comemorava o aniversário da cidade. Sabará estava completando 334 anos! Os moradores estavam numa animação só. Era um grande acontecimento. Foi quando comecei a ver de onde vinha a “gente de cor” da cidade. E eram muitos. Vinham das partes de trás do centro e do alto dos morros, talvez empurrados para longe com o passar dos anos!
Ouvindo histórias do lugar, freqüentando os arquivos e bares antigos entendi que a maioria das casas e mesmo os empreendimentos da cidade são fruto de herança. Isso explicava o que os negros faziam tão longe de onde tudo acontecia. O que eles herdariam? Passada a febre do ouro, das construções imponentes, da escravatura oficial, o que lhes restaria a não ser o descaso, o isolamento?
Foi desse modo que deixei de ver tão somente a beleza do lugar e passei a ler a história pelas entrelinhas da cidade.
Sessão Das Dez
Ao chegar do interior
Inocente, puro e besta
Fui morar em Ipanema
Ver teatro e ver cinema
Era a minha distração
Foi numa sessão das 10
Que você me apareceu
Me ofereceu pipoca
Eu aceitei e logo em troca
Eu contigo me casei
Curtiu com meu corpo
Por mais de 10 anos
E depois de tal engano
Foi você quem me deixou
Curtiu com meu corpo
Por mais de 10 anos
E depois de tal engano
O cinema...
Incendiou!!
Raul Seixas
Inocente, puro e besta
Fui morar em Ipanema
Ver teatro e ver cinema
Era a minha distração
Foi numa sessão das 10
Que você me apareceu
Me ofereceu pipoca
Eu aceitei e logo em troca
Eu contigo me casei
Curtiu com meu corpo
Por mais de 10 anos
E depois de tal engano
Foi você quem me deixou
Curtiu com meu corpo
Por mais de 10 anos
E depois de tal engano
O cinema...
Incendiou!!
Raul Seixas
Dicas de viagem
Estudar, trabalhar, conhecer gente, curtir, bater perna. Um lugar novo é ótimo pra passar por tudo isso. Viagens são quase sempre enriquecedoras sob muitos pontos de vista. E, para cada uma delas, arquivamos dicas. Umas lições mesmo. Engraçadas, necessárias, não importa. Nem sempre é preciso anotar, mas é sempre bom guardá-las em mente.
Por uma semana estive nas Minas Gerais. Visitei a capital e duas cidades do centro histórico. Dessa viagem listei algumas coisas e compartilho:
Dica 1: A primeira coisa a ser lembrada é que aquela velha Lei de Murphy existe e está sempre rondando... Por mais que se planeje há sempre a probabilidade de algo sair errado. Um plano b pode atenuar essa situação;
Dica 2: Dinheiro além do planejado para executar o tal – e eventual – plano b. Vá por mim!;
Dica 3: Uma câmera fotográfica é bom, mas duas, é ótimo!;
Dica 4: Leve um copo, mesmo plástico, no meio da bagagem. Você pode passar até duas horas procurando por um nos mercadinhos locais. Nem pense em pegar copos descartáveis nos bares e restaurantes ou reciclar um. Afinal, se copos descartáveis fossem pra reutilizar eles seriam chamados de reutilizáveis, né não?;
Dica 5: Aproveite o embalo do kit louças de viagem e leve um pacotinho de facas descartáveis. Nos aviões não é permitido o transporte de objetos cortantes, caso não seja um psicopata, é melhor comprar umas faquinhas plásticas. Isso facilita comer a pizza da noite, no quarto;
Dica 6: Evite, se possível, levar livros grandes, módulos e notebooks. Você jamais vai abri-los com tanta coisa para ver e visitar. É um pesinho que faz diferença carregar. Se precisa mesmo ver e enviar emails, hoje em dia é mais fácil ir a uma lan house. E, lógico, tente chegar a cidade, a pousada ou hotel para fazer isso. São quase sempre parte do pacote ou, pelo menos, mais em conta que os acessos assaltosos cobrados nos aeroportos;
Dica 7: Não sei quanto a você, mas sempre compro jornais locais. É bom pra entender o que a comunidade pensa e como age;
Dica 8: Se conheceu alguma figura interessante, troque emails. Telefone só depois de algumas mensagens;
Dica 9: Um bom tênis realmente evita as dores e o cansaço das pernas depois de um dia inteiro de caminhada fuçando os cantinhos da cidade.
Acho que posso parar por aqui. Se você também tiver alguma dica que chegou assim, meio no empirismo, manda aí. Quem sabe a gente não publica um livro, uma espécie de guia de viagens?!
Por uma semana estive nas Minas Gerais. Visitei a capital e duas cidades do centro histórico. Dessa viagem listei algumas coisas e compartilho:
Dica 1: A primeira coisa a ser lembrada é que aquela velha Lei de Murphy existe e está sempre rondando... Por mais que se planeje há sempre a probabilidade de algo sair errado. Um plano b pode atenuar essa situação;
Dica 2: Dinheiro além do planejado para executar o tal – e eventual – plano b. Vá por mim!;
Dica 3: Uma câmera fotográfica é bom, mas duas, é ótimo!;
Dica 4: Leve um copo, mesmo plástico, no meio da bagagem. Você pode passar até duas horas procurando por um nos mercadinhos locais. Nem pense em pegar copos descartáveis nos bares e restaurantes ou reciclar um. Afinal, se copos descartáveis fossem pra reutilizar eles seriam chamados de reutilizáveis, né não?;
Dica 5: Aproveite o embalo do kit louças de viagem e leve um pacotinho de facas descartáveis. Nos aviões não é permitido o transporte de objetos cortantes, caso não seja um psicopata, é melhor comprar umas faquinhas plásticas. Isso facilita comer a pizza da noite, no quarto;
Dica 6: Evite, se possível, levar livros grandes, módulos e notebooks. Você jamais vai abri-los com tanta coisa para ver e visitar. É um pesinho que faz diferença carregar. Se precisa mesmo ver e enviar emails, hoje em dia é mais fácil ir a uma lan house. E, lógico, tente chegar a cidade, a pousada ou hotel para fazer isso. São quase sempre parte do pacote ou, pelo menos, mais em conta que os acessos assaltosos cobrados nos aeroportos;
Dica 7: Não sei quanto a você, mas sempre compro jornais locais. É bom pra entender o que a comunidade pensa e como age;
Dica 8: Se conheceu alguma figura interessante, troque emails. Telefone só depois de algumas mensagens;
Dica 9: Um bom tênis realmente evita as dores e o cansaço das pernas depois de um dia inteiro de caminhada fuçando os cantinhos da cidade.
Acho que posso parar por aqui. Se você também tiver alguma dica que chegou assim, meio no empirismo, manda aí. Quem sabe a gente não publica um livro, uma espécie de guia de viagens?!
terça-feira, 14 de julho de 2009
De castigo
Cuidando de mais uma crise de uveíte - uma inflamação ocular - no olho direito.
Preciso dar um tempo em livros, revistas, jornais e, sobretudo, TELAS!
Retorno em breve, com novidades...
Preciso dar um tempo em livros, revistas, jornais e, sobretudo, TELAS!
Retorno em breve, com novidades...
segunda-feira, 6 de julho de 2009
Como diria Lee
Saúde
me cansei de lero-lero
dá licença mas eu vou sair do sério
quero mais saúde
me cansei de escutar opiniões
de como ter um mundo melhor
mas ninguém sai de cima
nesse chove-não-molha
eu sei que agora eu vou é cuidar mais de mim!
como vai, tudo bem
apesar, contudo, todavia, mas, porém
as águas vão rolar, não vou chorar
se por acaso morrer do coração
é sinal que amei demais
mas enquanto estou viva,
cheia de graça,
talvez ainda faça
um monte de gente feliz!
Rita Lee e Roberto de Carvalho
me cansei de lero-lero
dá licença mas eu vou sair do sério
quero mais saúde
me cansei de escutar opiniões
de como ter um mundo melhor
mas ninguém sai de cima
nesse chove-não-molha
eu sei que agora eu vou é cuidar mais de mim!
como vai, tudo bem
apesar, contudo, todavia, mas, porém
as águas vão rolar, não vou chorar
se por acaso morrer do coração
é sinal que amei demais
mas enquanto estou viva,
cheia de graça,
talvez ainda faça
um monte de gente feliz!
Rita Lee e Roberto de Carvalho
Assinar:
Postagens (Atom)