terça-feira, 23 de outubro de 2007

O Brasil tomando wXo

Quase quatro anos depois ando revendo minha graduação. Jornalista de formação, procurei e entrei no curso apaixonada pela idéia de informar da melhor maneira a sociedade que me rodeia. Tudo bem que antes da metade do curso, cai de amores pelo lado gráfico da informação, mas isso não mudaria o fato: era comunicação que eu queria pro resto da vida.

Escrevendo, propriamente, nunca trabalhei para redações. Aquela pressão (vinda de todos os lados), até hoje, me parece muito pouco produtiva. Obviamente publico textos de quando em vez para cadernos especiais, mas jornalismo diário, até agora, não me dá tesão algum. Já diagramei jornais semanais mas, mesmo esses, tenho um tempinho pra pensar sempre a melhor forma de apresentar o produto.

Entretanto, assistir os noticiários é quase um ritual. Vejo todos e quase ao mesmo tempo (o que deixa, por exemplo, a minha mãe louca!). Fico zapeando entre os canais com horários iguais. Alguns, têm reprise programada para logo mais. Presto atenção em tudo: entonação de acordo com a notícia, postura, quem é o âncora, se conheço os repórteres, colocações pertinentes, o que é notícia pra um e não é pro outro. Eu até mando email pros colegas, como não!

E é justo por essas observações que vou me identificando cada vez mais com o chamado jornalismo gráfico (isso é a diagramação com nome bonitinho!). De uns tempos pra cá, a gente sente até o cheiro do sangue na tela, na caixa de som, no papel, nos monitores, enfim. Às vezes me cansa tanta miséria, violência, corrupção. Entendo que a questão não tenha cunho exclusivamente jornalístico, afinal, é preciso relatar o que está aí.

Acompanhei semana passada o caso de Jorge Kauã. Sabe quem é? Aliás, a pergunta correta é sabe quem era? Ou pior, sabe quem poderia ter sido? O garoto, 4 anos, morreu com um tiro no peito, atingiu o coração. A mãe tentava escapar com ele e outro filho. Contava que traficantes invadiram a casa e não permitiram que saíssem. De repente, ela se viu no meio do fogo cruzado entre bandidos e polícia. O menino engorda as estatísticas da violência desenfreada no Rio de Janeiro. O destaque da noite era o jogo, em casa, da seleção brasileira.

E acho que é bem aí que o caldo engrossa. Onde exatamente nós (profissionais de comunicação) perdemos a droga do sentimento a ponto de prestar mais atenção na camisa do técnico? Nada contra a seleção, aliás, percebo no futebol um ópio necessário (e efetivo) quando tudo aqui parece estar a um passo de explodir. A boa e velha tática do pão e circo. Não sei é até quando vai funcionar.

Acho que dificilmente teria estrutura psicológica pra dar dia após dia esse mesmo tipo de notícia. E mais ainda, a nós jornalistas, é cobrada a importante e impossível tarefa da IMPARCIALIDADE. Já diria meu professor Sérgio Augusto Mattos, é mito! É humanamente impraticável não se tomar partido de coisa alguma. A coisa toda piora quando vidas estão em jogo!

Falei do Rio porque está na crista da onda, mas nossa Salvador, outros tempos cantada em verso e prosa por sua tranqüilidade, também amarga as estatísticas aumentadas quando se fala de violência. Não sei qual a relação da imprensa e sociedade nos outros países. Não sei se mudar o canal é medida suficiente. Às vezes parece que tudo que está ao meu alcance como, telespectadora, é desligar a tv.

Como jornalista, não sei. A indignação é pulsante! Confesso, no entanto, que nem sei por onde começaria. Um primeiro passo é urgente. A jornalista que dorme aqui cobra algo pra deitar a cabeça no travesseiro à noite (ou dia) convicta que as tarefas foram realizadas da melhor maneira possível sem ferir nem prejudicar a ninguém, muito menos a si própria. A cidadã que está de olhos abertos, cobra da jornalista, de seus colegas e qualquer outra pessoa, no mínimo a repulsa a tanto descaso!

2 comentários:

Anônimo disse...

Sabe, Rai. Lendo seu texto me identifiquei muito, tem dias que sinto exatamente isso. E eu, que faço parte dessa louca correria do jornalismo diário, tenho a impressão de que muitas vezes certas notícias não deveriam nunca virar notícias. Sei lá, algumas coisas precisam ser revistas. Tenho medo do que pode vir pela frente, tenho medo do que pode ser tornar a comunicação de massa (a televisão tão soberana, tão poderosa e tão fútil).
O fato é que sou um viciado nisso tudo, não sei viver mais fora desse ambiente das notícias em tempo real, da correria das redações e das entradas "ao vivo". Gostaria de poder ter mais tempo pra repensar o que escrevo e de como isso pode ser recebido para as milhares de pessoas que nos assistem e escutam....

Juca Badaró

Anônimo disse...

“Estudar o Império Romano é muito chato”. Luana, 12 anos, soltou a afirmação entre uma garfada e outra na hora do almoço. A tia Guida, apoiada pela avó e pela mãe, tentou mostrar que ela estava enganada. Listou rapidamente aspectos da influência romana na arte, na arquitetura, na religião cristã, na língua portuguesa, na engenharia... Mas o meu livro, disse Luana, só fala de guerra, guerra, guerra!

Como diz Juca, algumas coisas precisam ser revistas. Não só no noticiário. Nos livros de história também!

Bom saber que, mesmo mergulhados nessa frenética loucura – ou doida loucura frenética? – vocês se dão um tempinho para pensar no que é ou tem sido nossa prática jornalística.