sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Maquiagem

Acabo de ler meu primeiro Garcia Márquez. Memória de Minhas Putas Tristes. Apesar dos dois dias que levei, a leitura é simples. A história poderia se passar com qualquer um de nós. Karen (uma amiga de vulgo Biscoito) havia me falado meses atrás sobre uma outra obra dele: Cem Anos de Solidão. Biscoito, também jornalista, precisava ler para uma matéria no caderno cultural. Leu o original. Seu espanhol é perfeito! Li a tradução do Memórias e não saberia dizer o porquê da escolha e, tampouco vou contar o livro, oras!

É verdade que o tema abordado me fez pensar em coisas bastante próximas, como a solidão. Não é que me sinta só (não ainda!). O que acontece é que tenho amigos, em diferentes faixas etárias, passando por isso agora. Pessoas que foram priorizando suas vidas profissionais, por exemplo, e hoje, sem parceiros (cônjuges, amantes, cúmplices, qualquer um desses), filhos ou parentes próximos, se percebem solitários em seus pequenos ou luxuosos apartamentos ou casas à beira-mar.

Enquanto é dia, parecem irradiados pelo astro-rei. Vai anoitecendo e a condição de estar só se expande pela casa. É o que todos dizem e voltam-se a seus milhares de afazeres, na tentativa de esconder-se mais um pouco. Alguns deles saem pela noite e voltam às tantas. A mim parece angustiante. Tento estar com eles pra amenizar (do jeito que eu falo, parece uma festa), mas com todos é humanamente impossível!

Outro ponto abordado também no Memória é o amor tardio... Sabe aquelas pessoas que viveram a vida toda procurando, procurando (ou até não) e encontram o amor (tranqüilo ou excitante) com mais de 50 anos? Ou, no caso de nossa personagem, mais de 90. Isso me faz pensar que nem tudo está perdido para mim afinal, para os cinqüenta anos me faltam vinte e duas décadas passam rapidinho! Mas, falando sério, fico preocupada com casos de depressão. É um problema que quando se percebe, o estágio já é bastante avançado, na maioria dos casos.

Às vezes me vejo nesses amigos. Penso que caminho para o mesmo lugar, possivelmente para os mesmos problemas. Sem namorado, filhos, parafraseando o velho Machado: “...ninguém para transmitir o meu legado...”. Confesso que a sensação não é das mais agradáveis, mas também Renato Russo já cantava numa de suas genialidades: “...digam o que disserem, o mal do século é a solidão..!”. Se não é possível, sobretudo nos dias de hoje, colocar a vida profissional de escanteio, ao menos, vamos trabalhar dando umas olhadinhas rápidas para os lados. De repente, quem sabe, surge um solitário a menos desses tempos modernos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Esse eu tenho que comentar. Meu papa de cabeceira, Umberto Eco, diz que uma obra de arte é tão mais arte quantas leituras possa propiciar. Nao lembro se exatamente com essas palavras, mas com certeza é essa a idéia. Voce "leu" a solidão/depressão do velho jornalista que viveu para o jornal. Eu "li" a pureza, carinho, o amor à vida representado pela juventude, docura e virgindade da jovem prestadora de serviços sexuais: contemplação do belo. A amizade AMIZADE representada pela velha amiga, antes prestadora de serviços. A amizade que dá, na sua própria medida, o que o outro pede sem questionamentos, sem censura, sem porquês. E o sonho, mantido vívido, mesmo diante de um dia-a-dia mortiço. Entre outras coisas, me senti presenteada com a revelação inequívoca da trama, textura, contextura, tessitura... Nem sei qual palavra melhor descreve a REVELAÇÃO, perceber cada encontro de linha, das muitas linhas que iam e vinham na complexa trama urdida com maestria por Gabriel Garcia Marques! Um presente que só a maturidade pode dar.
Você começou bem!