História é uma coisa curiosa. É viva, mutante, adaptável, conveniente. Tenho estudado cada vez mais, embora no meu ritmo, a distância entre o que nos contam do povo negro e sua real contribuição no contexto histórico em Salvador, na Bahia, no Brasil.
Sem perceber me cerquei de conteúdo especial e variado essa semana: tenho acompanhado o alarde feito pela mídia a respeito de uma protagonista negra, bem sucedida, numa novela de horário nobre; assisti o filme Vista Minha Pele e fui, finalmente, ver a peça O Dia 14. As coisas se entrelaçaram de um modo mágico e surpreendente!
Li matérias de mais de cinco canais diferentes, meios diferentes, inclusive. Desde a véspera de estreia da nova novela de Manoel Carlos em que traz Tais Araújo, como uma de suas Helenas, sempre personagem central de suas tramas, o assunto é tratado com entusiasmo e expectativa. Afinal temos num folhetim das 20h, na emissora mais rica de TV do país, uma protagonista negra, modelo de luxo e bem sucedida. Mas aí, só para não perder o costume, a irmã de Helena é uma criatura imatura, problemática e envolvida com um bandido. Estava mesmo tudo muito fácil, né? É só pra gente não esquecer!
Na quarta-feira, assisti ao espetáculo O Dia 14, dirigido por Ângelo Flávio e também encenado pelo meu amigo, irmão de alma e de luta, Cleiton Luz. Belíssima montagem. Aos trancos e barrancos foi apresentada ao público suburbano no Primeiro Festival de Teatro da região. Falar do dia 13 de maio, qualquer livro de história trata, mas, o dia seguinte parece que perdura até hoje. Então, após três séculos de trabalho, quando nos tornamos politicamente insustentáveis e inviáveis, somos jogados nas ruas, sem dinheiro, sem assistência, completos “invisíveis sociais” e nos amontoamos nas ruas e casebres dando início à favelização da cidade. A peça toda é muito bem costurada.
Não satisfeita, vejo o filme Vista Minha Pele, de Joel Zito Araújo. Na trama os papéis são invertidos: a sociedade de consumo é negra, os produtos são voltados para negros, as festas e homenagens nas escolas privilegiam os negros e os brancos são discriminados e passam sufoco o tempo inteiro. Não diria que esse é um sonho de consumo, mas acho que podia funcionar!
Vai ficando cada vez mais difícil não brigar com o que aí está posto. Vão se tornando nítidas as diferenças. Se até a recente pesquisa do IBGE, me parece, as pessoas tem se declarado pardas mais vezes. Ainda que não concorde com essa denominação ou característica – porque a meu ver não é uma raça – é bom perceber que as pessoas tem se assumido mais. Estamos caminhando a passos lentos. É como no trecho que inicia a peça: “de lá pra cá, chicotada, gente apertada e enjoada”.
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