Por certo o entendimento que temos e fazemos de filmes e livros depende de nossa instrução e contexto, bem como da maneira que nos vemos e colocamos no mundo. Algumas pessoas fazem a mesma leitura, outras tantas têm uma visão diferente. Nesse sentido a arte é, sem sombra de dúvidas, instrumento essencialmente democrático. Por semanas estive empurrando com a barriga assistir O último rei da Escócia. Acabo de ver. Estou impressionada sob muitos aspectos.
É aí que entra o contexto. Estou tentando montar uma boa proposta de pesquisa. Fazer parte de um movimento de resgate cultural no subúrbio me encheu de idéias. O início do filme me pareceu seguir esse caminho: um médico escocês, recém-formado, cheio de gás, querendo se divertir, mostrar serviço e se livrar dos pais. Ledo engano. De repente a trama (des)embaraça uma teia perigosa costurada pela sedução do poder e esperança alheia.
No início, a observação de que o filme é baseado em fatos. Era década de 70, Uganda, África. Desconhecia a história do presidente Amin. A imagem era de um homem prepotente, arrogante, seduzido pelo poder da aliança com as elites. Segundo o filme, os britânicos o colocaram lá e eles próprios o queriam tirar. Merece uma segunda análise, claro, ainda estou no calor do processo, digerindo a película.
Mais que me impressionar (mais uma vez) com a forma como a África foi sendo - e ainda acontece - devorada em sua riqueza, me assusta entender que os processos políticos são semelhantes em quaisquer lugares no mundo. Por mais que o filme tente deturpar a imagem de Amin (não sei a origem dos produtores do longa-metragem), as situações são bastante parecidas: desconfiar, passar por cima, tirar do caminho. A máxima do se não estão comigo, estão contra mim. Também o número de mortos aqui fora gritante nos tempos da Ditadura e até hoje pessoas continuam com paradeiro ignorado por suas famílias.
O médico também se deixou encantar. Tornou-se amigo (leia-se cúmplice) do presidente e gozou de todas as mordomias que poderiam vir a reboque, pensando tratar de uma simples troca. Ah, não vou contar mais, loca e faz sua leitura.
Quando acabou pensei em como facilmente nos tornamos massa de manobra. Às vezes, como na trama, perigosamente. Coisinhas cotidianas que quando nos damos conta estamos envolvidos até o pescoço, maravilhados, iludidos! É ano de eleição municipal. A atual gestão apontada e eleita pela mídia como a pior dos últimos tempos. Até que ponto isso não é criação dos meios de comunicação, também conhecidos como quarto poder? Até que ponto foi possível trabalhar sem aborrecer muito os poderosos a quem cabe, de verdade, o comando da cidade? Seria Neylton da Silveira, encontrado morto há pouco mais de um ano, a diferença na Secretaria Municipal de Saúde? De que lado estaria ele? Será que ele queria tudo certo ou na verdade queria mais poder?
Como não se deixar cativar, seduzir pelo candidato que parece falar com você, parece entender exatamente suas necessidades? Como ler as entrelinhas do discurso? Não tenho as respostas. Acho que ninguém as tem, contudo, me parece um exercício. Um teste de observação a cada eleição seja municipal, estadual ou federal. Também estou em processo de aprendizado. Oxalá o dia em que filtrar essas informações seja algo que a gente tire de letra!
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